Candidato escreve receita de Miojo em redação do Enem e tira 560
Em outro caso, dissertações que apresentaram erros graves de grafia obtiveram nota máxima
O Enem 2012 já passou, mas não sem causar polêmica. Na última edição do
exame, um candidato escreveu na redação como preparar um macarrão
instantâneo no meio do texto, que deveria atender ao tema "Movimento
imigratório para o Brasil no século 21". O estudante recebeu a nota 560,
de um total de 1.000 pontos. As informações são do jornalO Globo desta terça-feira, 19.
Nos dois primeiros parágrafos, o vestibulando até chega a tratar de
imigração ilegal no País. No trecho seguinte, no entanto, o candidato se
atém à receita do Miojo.
Ele escreveu: “Para não ficar muito cansativo, vou agora ensinar a fazer
um belo miojo, ferva trezentos ml’s de água em uma panela, quando
estiver fervendo, coloque o miojo, espere cozinhar por três minutos,
retire o miojo do fogão, misture bem e sirva” (sic). No
parágrafo final, o aluno retorna ao tema proposto como se nada tivesse
ocorrido. Das 24 linhas escritas, 4 são dedicadas à receita.
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), a presença da receita foi
detectada pelos corretores e considerada "inoportuna" e "inadequada", o
que lhe provocou uma "forte penalização".
O ministério afirma que as competências mais prejudicadas foram as de
número 3 e 5, que, entre outras coisas, mediam o poder que o candidato
detinha para selecionar, relacionar, organizar e interpretar
informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista
e também elaborar uma proposta de intervenção para o problema abordado,
respeitando os direitos humanos e considerando a diversidade
sociocultural. Cada uma das cinco competências avaliadas pelo MEC possui
a pontuação máxima de 200 pontos. Nas citadas, o candidato obteve 100 e
40 pontos, respectivamente.
O MEC diz ainda que, em sua totalidade, o candidato não fugiu ao tema e
não feriu os direitos humanos. Segundo a pasta, é preciso considerar que
a análise de texto é feita sobre o todo, com foco no conjunto do texto,
e não em cada uma de suas partes.
Para Rogério Chociay, professor aposentado do Departamento de Letras da
Unesp e especialista em redação de vestibular, a análise do conjunto foi
justamente o que faltou para que o texto fosse mais penalizado. "No
momento em que o estudante opta por inserir a receita no meio do seu
texto, ele quebra o processo argumentativo e o princípio da dissertação
e não configura um texto como um todo", diz. Segundo o professor, se o
mesmo ocorresse nos vestibulares das principais universidades públicas
no País, o aluno teria seu texto severamente punido ou então reprovado.
Nota mil
Redações com nota máxima e erros de português também foram reveladas pelo O Globona
edição de ontem. Os textos apresentavam erros de grafia, como
“rasoável” (em vez de razoável), “enchergar” (em vez de enxergar) e
“trousse” (no lugar de trouxe). Várias textos apresentavam ainda graves
problemas de concordância verbal, acentuação e pontuação, segundo o
jornal.
Sobre os critérios de correção, o MEC esclarece que é preciso considerar
que "a análise de texto é feita como um todo e que eventuais erros de
grafia não significam que o aluno não domine os padrões da língua". De
acordo com o ministério, uma redação pode ter a pontuação máxima mesmo
apresentando erros em cada competência avaliada. "A tolerância deve-se à
consideração, e isto é relevante do ponto de vista pedagógico, de ser o
participante do Enem, por definição, um egresso do ensino médio, ainda
em processo de letramento na transição para o nível superior."
Segundo Chociay, os erros encontrados nos textos que alcaçaram a
pontuação máxima evidenciam o pricipal problema do Enem: o seu
"gigantismo". Para o professor, a abrangência da avaliação esbarra na
questão do treinamento dos corretores. "Os membros da banca corretora
têm de ser 100% competentes no que se refere ao domínio da língua
portuguesa. Quando se fala da correção de milhões de redações, isso é
algo difícil de se garantir."
Para o professor, no entanto, caso os corretores acreditassem que os
erros não prejudicavam a integridade dos textos, caberia a eles ao
menos apontar as falhas e fazer o comentário. Isso, no entanto, não
ocorreu.
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