NIEMEYER E A CABANAGEM
Em 46 anos de vida pública, eu tive o privilégio de conviver com pessoas de grande importância para a humanidade. No exercício de mandatos nas áreas municipal, estadual e federal; na presidência do Senado, ministro do Desenvolvimento Agrário e da Previdência Social, e também na presidência do Congresso, vivi e participei da política do Pará e do Brasil. Por duas vezes fui governador do meu Estado – os episódios mais gratificantes da minha história – e isso me deu oportunidade de estabelecer contato com líderes dos mais diversos segmentos da política, da cultura e também das artes.Conheci Juscelino Kubitschek, o maior presidente que o Brasil já teve – na minha opinião – no dia 8 de dezembro de 1968, aqui em Belém. Poucos dias depois, ele seria preso no Rio de Janeiro, após a edição do AI-5. Foi JK quem tirou o Pará do isolamento com a construção da Belém-Brasília. Fui amigo de Dom Helder Câmara, por quem eu tenho grande admiração; convivi com Tancredo, meu colega na Câmara Federal e depois como governador; Franco Montoro, Leonel Brizola, Ulisses Guimarães – o senhor das Diretas; e ainda Teotônio Vilela, a quem eu recebi em minha casa em Belém, de onde seguimos para Xambioá e São Geraldo do Araguaia para visitar o local onde aconteceu a guerrilha do Araguaia. Convivi e conversei muitas vezes com FHC, o presidente e líder do PSDB nacional. Também convivi com Lula, ainda sindicalista (participei da primeira reunião, no ABC paulista, sobre a criação do PT), depois como presidente da República e mais tarde fiz parte do comitê político da sua reeleição.
Quando o presidente José Sarney visitou a China eu fiz parte de sua comitiva e lá conheci e conversei longamente com Deng Xiaoping, o líder responsável pela revolução no mercado chinês que levou a China a ocupar o 2º lugar na economia mundial. Tantas outras proeminentes pessoas eu conheci, troquei ideias e aprendi. Mas, nesse momento, em que o mundo todo comenta a morte de Oscar Niemeyer, eu registro o episódio sobre o monumento à Cabanagem, que ele projetou e doou ao nosso Estado. É a única obra erguida, de Niemeyer, em todo o Norte do País. Eu o conheci no momento em que – quando fui governador –o Pará se preparava para festejar o sesquicentenário do movimento da Cabanagem. Eu e o jornalista e historiador Carlos Rocque estabelecemos contato com ele e fizemos muitas reuniões no Posto 6 da Avenida Atlântica, no Rio de Janeiro. Levamos a Niemeyer extenso material sobre o assunto. Quando o projeto ficou pronto, perguntei qual era o custo e ele me disse haver se encantado com os cabanos e que se sentia devedor depois ter conhecido a história da única revolução no Brasil e na América Latina, na qual o povo havia tomado o poder. E explicou a sua obra, que é a representação de um dedo da mão da história. Um dedo fraccionado, justamente quando os cabanos são derrotados. A mão fica embaixo e o dedo aponta para o infinito, porque a história não termina. Abaixo da mão, está a cripta que guarda os restos mortais de líderes do movimento.
O monumento à cabanagem, de Oscar Niemeyer, está erguido na entrada de Belém, a capital do Pará. A revolta dos cabanos ainda é muito pouco conhecida, e mesmo eu, que já li muita coisa sobre o assunto, fiquei surpreso em saber que a Rua 13 de Maio, no centro de Belém, não é uma alusão à Lei Áurea e sim ao dia em que Belém foi bombardeada pelo brigadeiro d’Andrea, em 13 de maio de 1836, e os cabanos derrotados.
Aqui eu presto a minha homenagem ao gênio da arquitetura moderna, que distorceu as retas e criou obras fantásticas como Brasília, uma cidade em formato de avião, no qual a Praça dos Três Poderes está na cabine, e os ministérios representam as janelas. A catedral, o Palácio da Alvorada e o prédio do Congresso Nacional são obras geniais. Como dizia o presidente Juscelino, Brasília é a obra-síntese do projeto de geopolítica para retirar o Brasil da beira do Atlântico e permitir a sua interiorização.
JADER BARBALHO
*Texto originalmente publicado no Jornal Diário do Pará no dia 09 de Dezembro de 2012.

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