Reprodução - Portal Salinópolis da Amazônia/Rafael Coimbra
Se os jovens de hoje o vissem vagueando com seu carro de mão pelas ruas da cidade, concluiriam tratar-se de um andarilho qualquer. Julgariam mal, todavia, não era andarilho, tampouco um qualquer. Em verdade, vos digo que sua fama, na cidade, equivalia à dispensada à Sapa do Caranã.
Se tu lês isto com incredulidade, recomendo indagar aos contemporâneos da época. Eles confirmarão tal proeza. E, se não lhes escapar à memória, vão acrescentar que o nosso figura virou ainda personagem de quadrilha cômica.
Verdade é que ninguém, senão os familiares próximos, o conhecia pelo nome de batismo. Alguns chamavam-no de JJ, sem saber precisamente o significado das duas letras; outros, pejorativamente, de "Enraba Cabra". Certo é que o anonimato do prenome foi compensado pela notoriedade das ruas. E queres reconhecimento mais genuíno do que o dispensado pelas ruas?
Todos os dias ele percorria os logradouros da cidade, sempre acompanhado de seu companheiro inseparável: o carrinho de mão. Ganhava a vida carregando água da Fonte do Caranã para as residências de quem quer que precisasse de seus serviços. E, assim, fez-se famoso. Mas, as mesmas ruas que lhe traziam a glória, impunham-lhe também o inferno. Era nessas ocasiões que JJ servia de gozo geral para os transeuntes, que lhe importunavam com alcunha de “Enraba Cabra”, ao que ele retorquia soltando alguns palavrões e, às vezes, partia para cima de quem lhe tirava a paciência, e alertava sempre: “Não mexe com quem tá quieto”. Afora esses incômodos, seguia seu caminho tranquilo e sereno.
Certa vez, ele partiu para a contenda com outro sujeito, não porque este lhe dizia o apelido, mas por uma razão mais nobre. A razão era que o indivíduo ousou lhe disputar a amada: uma moça que frequentava a Fonte do Caranã, e que o nosso personagem a tinha por namorada. Não se sabe em que pé ficou a briga; sabe-se, porém, que JJ continuou amando, e, à revelia dos profetas, acrescentou mais versículo à Sagrada Escritura: nem só de carregar água viverá o homem…
E, assim, prosseguiu… até que um dia ele, que tantas vezes empurrou o seu carro de mão, chegou à residência de sua mãe carregado pelo carro de outro. Em 16 de dezembro de 2013, JJ foi atropelado por uma moto na Avenida Miguel de Santa Brígida, indo a óbito.
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