Na Pesca, Helder busca luz própria e foco para aplicar o orçamento
KaliuAndrade
Ministro quer assegurar e gastar os R$ 254 milhões destinados à Pasta
O cenário é o retrato perfeito e acabado do desafio entregue a Helder Barbalho, o novo ministro da Pesca. Aos 35 anos, Helder é formado em administração, tem pós-graduação em gestão pública pela FGV de São Paulo, foi vereador, deputado estadual, duas vezes prefeito da segunda maior cidade do Pará, Ananindeua, mas é nacionalmente conhecido como o filho de Jader Barbalho, um dos principais caciques do PMDB.
Na Pesca, Helder tenta adquirir luz própria. Ele tem um foco: a Produção. Mas vai começar cortando os exageros, como o aluguel do prédio no SBS. Ele negocia outro imóvel pela metade do preço. Outra medida inevitável será o recadastramento e a classificação de quem efetivamente é Pescador no país, o que deve reduzir significativamente os R$ 2 bilhões que a União gasta com o pagamento do seguro defeso – espécie de seguro desemprego do Pescador.
Helder não quer mais dinheiro, apenas assegurar e gastar o que já tem será um avanço. Nesse aspecto, é o ministro dos sonhos do colega da Fazenda, Joaquim Levy. Num país com uma costa de mais de oito mil quilômetros de extensão, o consumo de Peixe pela população está muito aquém do recomendado por organizações internacionais – é de 9 quilos por habitante, ante 12 considerado ideais. Por isso a palavra-chave no ministério, a partir de agora, é “Produção”. A meta é dobrar a Produção da Aquicultura e Pesca em cinco anos.
Com esse objetivo, Helder deve levar nos próximos dias para o ministro Levy uma proposta para diminuir a carga tributária da ração, que representa 70% do custo daAquicultura. O ministro também deve lançar um ambicioso programa de renovação da frota Pesqueira, que tem mais de 40 anos de uso e está atrasada tecnologicamente.
Abaixo, os principais trechos da entrevista que o ministro Helder Barbalho concedeu ao Valor, na tarde da última quinta-feira.
Valor: O senhor assume com uma Medida Provisória que endurece os critérios de pagamento do seguro desemprego aos Pescadores. Que avaliação faz das mudanças?
Helder Barbalho: O governo acerta no momento em que amplia a capacidade de valorizar quem vive da Pesca, quem precisa do benefício quando está proibido de exercer a atividade. Até a MP, quem tivesse um ano de registro como Pescador podia requerer o seguro defeso. Agora, a carência passa a ser de três anos para o pedido. Dito isso, acho natural que haja discussões e debates, principalmente nas categorias atingidas e vamos ouvir os argumentos.
Valor: O senhor considera o prazo de três anos razoável?
Helder: Na minha ótica e na do governo, temos que fortalecer as políticas para quem é efetivamente Pescador e tem na Pesca a sua renda. O que o governo está fazendo é cruzar seus dados para que quem tem o perfil do Bolsa Família receba o Bolsa Família, e quem tem o perfil para o seguro defeso, receba o seguro defeso. Mas estamos agindo não só por meio da medida provisória, mas também ampliando o controle sobre a emissão dos registros de Pescador.
Valor: De que forma?
Helder: Estamos trabalhando num sistema que faça o cruzamento de todas as informações internas do Ministério da Pesca, como também dos outros benefícios sociais pagos pelo governo federal, para termos a certeza de que, primeiro, quem está recebendo é realmente Pescador e que não há sobreposição do defeso com outros programas do governo federal. “Na minha ótica e na do governo, temos que fortalecer as políticas para quem é efetivamente Pescador”
Valor: A medida provisória proibiu que os Pescadores que recebem o defeso acumulem o benefício com outras políticas sociais do governo federal, correto?
Helder: Exato. Partindo do princípio de que o seguro desemprego para o Pescador artesanal é pago porque ele depende da atividade como receita familiar, esse benefício estará sendo pago a quem realmente necessita dele. Em paralelo a isso, discutimos com a Casa Civil um decreto que possa classificar os diferentes tipos de Pescadores.
Valor: Como assim?
Helder: Hoje, o Pescador esportivo tem o mesmo registro do Pescador artesanal. Não há diferença no documento que recebem. Com o decreto, pretendemos criar categorias como a de Pescador exclusivo, ou o de quem tem a Pesca como atividade principal mas tem outras fontes de renda, o Pescador de lazer, etc. Isso vai provavelmente exigir um recadastramento, mas permitirá que saibamos exatamente quem dos 1,025 milhão dePescadores registrados deve receber o seguro defeso e quem tem o registro mas não se enquadra no perfil.
Valor: O senhor já tem ideia do impacto que a medida terá?
Helder: O gasto anual com o seguro é de cerca de R$ 2 bilhões por ano. Mas, neste momento, quantificar seria precoce.
Valor: Mas haverá algum ganho fiscal ainda este ano?
Helder: Este ano não terá um impacto tão grande porque a concentração maior de pagamentos do seguro defeso é entre novembro e março de cada ano e a MP entra em vigor em 1º de abril.
Valor: O Ministério da Pesca também sofreu críticas, inclusive dos órgãos reguladores do governo, sobre fraudes no subsídio dado para a aquisição de óleo diesel para embarcações. Isso não foi modificado até agora.
Helder: Mas já está sendo analisado. Atualmente os recursos são repassados a colônias ou entidades que representam Pescadores. A intenção é que, assim como o Bolsa Família, possamos fazer com que esse benefício chegue direto ao Pescador, talvez por meio de um cartão que ele possa usar diretamente para abastecer. A Controladoria Geral da União também está trabalhando conosco num sistema para que o Pescador possa fazer a prestação de contas desse benefício. Isso está sendo pensado. O que precisamos é saber se o Pescador usou o combustível para Pescar, porque o subsídio é mais uma política do ministério de ampliação da Produção.
Valor: Quando se fala num governo com 39 ministérios, o da Pesca é citado como um dos que poderiam se transformar numa secretaria. É realmente necessário ter um ministério?
Helder: A Pesca no Brasil, a médio prazo, pode se transformar num dos principais vetores da economia do agronegócio. Basta olhar para os lados e ver como referência países como Chile e Peru que viram a Pesca como oportunidade extraordinária. O papel desse ministério é construir o ambiente para que quem produz, o faça.
Valor: Mas a estrutura hoje é de um prédio de 14 andares, moderno, fora da Esplanada dos Ministérios…
Helder: O ministério vai sair desse prédio. Não dá para gastar R$ 1 milhão por mês com aluguel. É muito alto. Quero reduzir isso pela metade e rever também os principais contratos. Nosso custeio é muito elevado. O Ministério da Pesca chega a consumir 70% do Orçamento executado com custeio. Temos que ter recursos para investimentos e não congelar o nosso Orçamento em custeio. A intenção é, primeiro, diminuir o custeio e depois, sem prazo, trabalhar num concurso pois não temos quadros próprios entre os 500 funcionários contratados. Mas neste momento, até por orientação da presidente, vamos diminuir o nosso custeio para gastar melhor.
Valor: Mas o ministério recorrentemente tem deixado de gastar todo o seu orçamento.
Helder: É verdade. Para você ter uma ideia, o orçamento de 2015 é de R$ 254 milhões, mas o gasto foi de R$ 154 milhões em 2014. É verdade que a pasta já teve orçamento de R$ 773 milhões em 2010, dos quais gastou R$ 267 milhões. Comparando os números de 2015 com o ano em que mais se conseguiu gastar, que foi 2010, ainda estamos muito próximos [da execução atual].
Valor: Por que o Ministério não consegue aplicar os recursos?
Helder: Acho que temos que ter foco.
Valor: E qual é o seu foco?
Helder: Produção. Aumentar a Produção. O objetivo é em cinco anos sair de umaProdução de 450 mil toneladas de Peixe em Aquicultura para 2 milhões de toneladas por ano e de 780 mil toneladas de Pesca para 1 milhão de toneladas/ano.
Valor: Será necessário alguma medida adicional?
Helder: Estamos concluindo, para apresentar ao Ministério da Fazenda, uma proposta para diminuir a carga tributária da ração, que representa 70% do custo da Aquicultura, que é onde nós podemos crescer.
Valor: Dado o cenário de restrição fiscal, como fazer isso?
Helder: Naturalmente é um processo de convencimento. Podemos reduzir em até 20% o preço do Pescado da Aquicultura, com a desoneração.
Valor: O senhor falou no crescimento da Aquicultura. Há planos também para a Pesca?
Helder: Na Pesca o gargalo para a ampliação, mesmo pequena, é a frota Pesqueira, que precisa ser renovada. Nossa frota já ultrapassa 40 anos, em média.
Valor: Isso significa crédito?
Helder: Sim. Há algumas linhas que compõem tanto o Fundo de Marinha Mercante como também o próprio Pronaf que permitem financiar essa renovação de frota.
Valor: Estamos falando de quanto?
Helder: A nova linha do Pronaf que será lançada em julho terá R$ 2 bilhões. Oferecemos R$ 4 bilhões desde o final de 2012, 2013 e 2014 e apenas R$ 1,6 bilhão foi acessado.
Valor: Então não precisa de dinheiro novo?
Helder: Não. Se o governo disponibiliza R$ 2 bilhões e isso chegar de fato ao produtor, cumpriremos essa meta inclusive antes do prazo.
Valor: O governo vai ampliar o número de terminais pesqueiros?
Helder: Há seis terminais em operação e nos próximos dois ou três anos, no máximo, devem aumentar para 12. Estamos conversando com o Ministério do Planejamento sobre o melhor modelo de gestão dessas áreas. Hoje, os terminais funcionam como empresas públicas, mas a intenção é aproveitar o conhecimento adquirido com as concessões feitas pelo governo federal em portos e aeroportos para que os novos terminais sejam administrados nesse modelo.
Valor: Há interesse da iniciativa privada em investir nos terminais?
Helder: Hoje eles basicamente prestam serviços como recepção de produto, distribuição de gelo, pesagem. A proposta é agregar valor transformando essas áreas num complexo onde se possa fazer também a manutenção das embarcações e em última instância que se transformem num polo industrial e até de turismo. “A Pesca no Brasil, a médio prazo, pode se transformar num dos principais vetores do agronegócio”
Valor: Como ministro do PMDB, o que o senhor acha que falta para melhorar a relação entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo?
Helder: Acredito que a responsabilidade política de todos os atores envolvidos deve permear e balizar uma relação em que as agendas do governo, junto com as agendas do Congresso, possam, acima de tudo, ser pautadas pela agenda do país. O PMDB como governo tem essa compreensão do seu papel, e o presidente Michel Temer, como vice-presidente da República e presidente nacional do partido, está trabalhando para que o PMDB efetivamente possa colaborar, seja na construção de opiniões, seja em eventuais adequações de propostas.
Valor: Trabalhando em quê?
Helder: Ele vai fazer reuniões periódicas em que o partido esteja dialogando com quadros do governo, não só com os seus membros, mas com membros de outras siglas e quadros do governo. Nesta segunda-feira, faremos uma reunião com o ministro Joaquim Levy (Fazenda), com a presença dos presidentes e dos líderes da Câmara, do Senado e dos ministros do PMDB para discutir pautas importantes que o Congresso haverá de apreciar e que envolvem a economia do país.
Valor: De quem deve ser a iniciativa para distensionar a relação entre Congresso e governo?
Helder: Todos têm a responsabilidade de construir pontes. Essa responsabilidade não pode ficar restrita ao ministro Pepe Varas (Relações Institucionais). Cabe a todos os ministros fazer gestos, desde a mais simples percepção a um parlamentar, ao esclarecimento de agendas. Receber parlamentares de forma absolutamente respeitosa, ir ao Congresso sempre que chamado, e não apenas quando chamados, mas nos colocando à disposição. São gestos que mostram que o governo compreende a importância do Parlamento. Se nós construirmos uma relação que seja a mais qualificada, os resultados serão, sem dúvida alguma, aquilo que é a razão tanto dos mandatos parlamentares quanto do Executivo.
Valor: A disputa entre PT e PMDB pela presidência da Câmara azedou essa relação?
Helder: Não creio. PMDB e PT não conseguiram fazer um entendimento que unificasse uma candidatura. No momento que não se conseguiu, de forma legítima, tanto PT como PMDB entenderam que deveriam apresentar candidatura. Como também o fizeram PSB e PSOL. Isso acaba soando de forma estranha, por serem dois partidos de uma mesma base. Mas são partidos que têm histórias que em alguns momentos convergem e em outros divergem, mas são partidos absolutamente distintos. Não creio que permanecerá qualquer dificuldade entre os partidos por conta de uma eleição. A maior demonstração de que isso não é um problema entre partidos é que PMDB e PT compõem o mesmo governo e, no Senado, o PT deu apoio à reeleição do presidente Renan Calheiros.
Valor: Mas o presidente da Câmara comanda uma pauta própria.
Helder: É necessário dar tempo ao tempo. Neste momento, o presidente Eduardo Cunha cumpre a agenda que o elegeu. Seria muito estranho, em duas semanas, ele ignorar a pauta que apresentou. Isso não quer dizer que o presidente da Câmara, ao construir uma pauta combinada com os parlamentares, usará do cargo para causar constrangimentos ao governo. Tenho certeza de que o presidente Eduardo Cunha, com a sua capacidade de articulação e compreensão da importância da função a qual ele exerce, de que teremos uma relação absolutamente respeitosa entre o Congresso Nacional e o Poder Executivo.
Valor: Mas a agenda do presidente da Câmara tem impacto fiscal, num momento que o governo prega a austeridade, como é o caso do orçamento impositivo.
Helder: Sem entrar no mérito sobre o que isso significa sob o aspecto financeiro e fiscal, acho que o governo deve cumprir com aquilo que o parlamento ajuste nas suas emendas. Isso fortalece a democracia. Em outros países isso tem sido uma prática madura, sem que compreenda qualquer tipo de fragilidade nas relações.
Valor: O orçamento impositivo vai trazer alguma mudança do ponto de vista político?
Helder: Temos que prestigiar aqueles que colocam emendas parlamentares numa determinada pasta. Por exemplo: eu recebi um deputado que, dos R$ 15 milhões que tinha direito, colocou R$ 10 milhões no ministério. Não conseguiu fazer a liberação devida e não foi por culpa do governo. Temos que ter clareza que uma emenda parlamentar não pode ser um instrumento de barganha. A emenda, para quem faz a ação parlamentar no Estado, é a forma direta que o parlamentar tem de atender uma determinada localidade. Me preocupa quando vejo alguns depreciarem a emenda parlamentar. Quem faz as atividade política nos Estados compreende que isso é uma forma inclusive de a sociedade entender que o parlamentar também é um ator que efetivamente cumpre com o papel de melhorar a vida das pessoas. Não creio que isso vá aumentar ou diminuir dependência ou independência. O que vai melhorar ou deixar de melhorar a relação, reciprocamente, é estreitar o diálogo que tem que ser base da relação do poder Executivo com o Legislativo.
2 Comentários
tudo o que o ministro fala é importante menos nós pesacadore artesanais o que ele prevê sobre o nosso futuro será que nós não existimos ?
ResponderExcluirGOSTARIA DE SABER QUAL O PARLAMENTAR PARAENSE QUE ELABORU ALGUMA EMENDA PARLAMENTAR PARA MELHORAR A QUALIDADE DE VIDA DOS PESCADORES ARTESANAIS ?
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