Sr. Governador: não volte

 POR LÚCIO FLÁVIO PINTO
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Na semana passada o governador Simão Jatene pediu – e obteve – autorização para se ausentar do país.Informou que iria fazer viagem de férias à Europa, com base em Roma, na Itália, entre os dias 7 e 16. Em férias, tiraria do seu bolso o dinheiro para custear as próprias despesas e as da esposa. O erário suportaria apenas as 14 diárias não de um ajudante de ordens, como é comum, mas do chefe da sua casa militar, tenente-coronel César Maurício de Abreu Mello, da Polícia Militar.

O governador não teve a gentileza de informar ao poder legislativo que, aproveitando o fare niente, sua excelência não abdicaria de trabalhar, ao contrário do que é acusado de fazer (ou não fazer). Convidaria o papa Francisco para visitar o Pará em outubro.

O Sumo Pontífice teria então a oportunidade de testemunhar a maior procissão do mundo, com frequência que é atribuída ao Círio de Nazaré, de dois milhões de devotos. Ou seja: o equivalente à população da região metropolitana de Belém, toda ela fora das suas casas e espalhada pelo percurso da romaria.

Qualquer que tenha sido a preparação e o objetivo da viagem do governador, é impossível que não cause perplexidade (e revolta) ao cidadão. Belém (como todo Pará) vive um momento de insegurança, quase de pânico. Tanto pela violência cotidiana, que se tornou banal, apesar do seu índice assustador, como pela reincidência das execuções sumárias, já pela conta das dezenas, por uma milícia entranhada na Polícia Militar, que mata desbragadamente por vingança.

Na sua meteórica manifestação sobre o grave problema, o governador prometeu tomar medidas imediatas, que até hoje não adotou. Nenhuma. Não foi sequer ao enterro do soldado morto em serviço, o que devia ter feito. Não para passar a mão na cabeça dos vingadores, que se transformam em justiceiros sanguinários à margem da lei (e a desafiando).

Mas para uma palavra de conforto aos familiares do militar morto em combate de rua contra supostos criminosos. E para que todos saibam que ele não está insensível aos azares e sofrimentos do seu povo, que o tornou o governador do Pará mais vezes eleito pelo voto direto (como isso se tornou possível, é um atestado do baixo nível de consciência política dos paraenses).

Talvez como eu, o governador cultivou na juventude, que chegamos a partilhar, aversão a Carlos Lacerda. Ele foi nefasto para o país, no balanço dos seus acertos e erros. Mas de vez em quando revejo uma sequência de fotos em que ele aparece cercado por presidiários em movimento de protesto dentro da penitenciária Lemos Brito.

O governador da Guanabara está sozinho. A princípio, foi hostilizado e parecia que ia se sair muito mal do gesto audacioso. Aos poucos, com sua oratória e sua coragem, dobrou aqueles homens brutos e impôs a sua autoridade. Admirei muito aquele moimento do Corvo. Ainda mais porque talvez eu não tivesse a mesma coragem.

O governador não devia ter criado essa viagem de férias agora. Se teve a infeliz ideia, devia tê-la cancelado. Se foi a Roma e viu o papa, devia ter retornado imediatamente para estar neste momento em Belém. Na condição de comandante-em-chefe da Polícia Militar, se não se sentisse em condições de imitar Lacerda, indo aos policiais, pelo menos negociando com eles, a partir de uma posição de mando. Evitando que, amanhã, Belém esteja sujeita ao sobressalto de ruas entregues à selvageria impune, conforme a boataria, insuflada pelos oportunistas de sempre.

Se tiver preferido continuar suas férias europeias, como paraense, faço um pedido ao governador: fique por lá – se possível, de vez. Renuncie ao cargo, que já não exerce. Abandone o comando, que, pela lassidão, deixou de assumir. Abrevie seu próprio dissabor de estar no mais elevado cargo público do Estado num momento tão crítico – e a nossa desventura de ainda tê-lo nesse cargo.

O senhor não mais o merece.

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